A luz das 16:30

Quando, aos meus seis anos de idade, uma professora pediu à nossa turma para desenhar o que mais gostávamos de fazer, não pensei duas vezes: desenhei o corredor do meu prédio onde brincava com meus amigos. Na hora não soube dizer por que. Não era pelo lazer, pela brincadeira em si, pela distração ou por acaso, mas me lembro de justificar dizendo que o Sol entrava pela janela e coloria o corredor. Eu falava com a professora: “sabe, quando o sol entra e você fica no cantinho, brincando?”.

Um momento que me confortava. Não existia desenho ou palavras que traduzissem aquele sentimento. O lápis de cera laranja não era suficiente. E ainda não foi!

Vinícius Steinbach

sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Uma história de Vicente - 7

19:55, 31 de dezembro de 2010. Terminou de fechar a bolsa. Tomou o último gole do suco que já estava quente. Levantou da mesa. Deu um tchau para a moça da faxina da redação e desejou um bom 2011. No elevador ouviu tocar “Mucuripe” cantada pelo Fagner. Gostou.

Lá em baixo parou para o último café. Sentou e pediu um carioca (expresso com mais água). Lendo o caderno dois do próprio jornal, tentou lembrar-se dos réveillons passados. Réveillons ou reveions? Não importava. O melhor deles foi o que passou com a irmã naquele posto de gasolina na entrada de São Thiago, em Minas Gerais. O ônibus que os levaria de Divinópolis para Juiz de Fora quebrou bem ali. Não viram fogos, só clarões. Não fizeram a contagem regressiva, mas regressaram, depois, felizes... Saudades da irmã.

Quando deu o primeiro gole sentiu que a xícara estava muito quente. Pra que eles deixam a xícara na água fervendo? Já vira algumas pessoas reclamando disso e pedindo uma fria. Não queria problema agora... Agora, era tarde demais pra 2010.

Do outro lado da rua viu um monumento em homenagem aos heróis da segunda guerra. “A Cobra Vai Fumar”. Não havia sentido naquele monumento, era feio, mas era bonito. Entendem? “Mais fácil cobra fumar do que o Brasil entrar na guerra”. Dito e feito. Será que havia algum pracinha na pracinha. Já era tarde pra 2010.

Chegou no prédio e o porteiro de sempre já foi dizendo: - Tudo preparado seu Vicente!

Sim! Foi convidado pelos porteiros para a confraternização deles na passagem. Digno demais. O único que topou passar com eles também foi José Alexandre do escritório. O zelador tinha a chave do terraço e Vicente o champanhe.

José tocou a campainha às 23h30minh. Subiram de elevador até o 20 e depois numa pequena passagem no teto que estava aberta. Todos estavam lá em cima como reis. Donos do mundo. De alguma forma aquele 2010/2011 lembrava muito o 2003/2004 com a irmã no posto de São Thiago. Simples e eficiente. Todos se abraçaram. Lá de cima via-se o mar.

Dessa vez veria os fogos.

5...4...3...2...1...

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Uma história de Vicente - 6

Fazia aquilo por inércia. Gostava, mas vinha a reboque. Queria mesmo era encontrar algo, no meio daquilo tudo que lhe fizesse arder. Sempre escreveu bem e como não sabia jogar bola, virou jornalista. Queria na verdade ser poeta. Ainda não era ou sempre foi? Escreveria um livro. Só precisava de algum motivo realmente bom. Algo que lhe fizesse arder.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Uma história de Vicente - 5

Era jornalista de formação. Trabalhava agora no impresso. Imprensa impressa. Uma letra. Não havia lhes dito que ele trabalhava com papéis. Papéis impessoais. Mais de uma letra. Jornal não tem expressão? Tem significação. Impresso. Mas porque impessoal? Já começava a se questionar sobre o assunto com o jornaleiro e a saudade dos velhos tempos. Afinal, o agora era lindo...

sábado, 18 de dezembro de 2010

Uma história de Vicente - 4

Saiu com a necessidade de poesia. Na banca, o jornal não interessava tanto. Foi buscar no jornaleiro alguma lembrança daquela cidade. Encontrou a velha reclamação de que “naquele tempo que era bom”.

Se hoje não tem mais graça, o que Vicente diria no futuro?

“Naquele tempo a saudade é que era boa”?

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Uma história de Vicente - 3

O trabalho de Vicente ainda não era conhecido. Sabia-se que trabalhava com papéis. De que espécie? Não sei.

O apartamento era bom. Tinha vista para o verde. Dentre as exigências, Vicente só conseguiu uma parede revestida de madeira e o sol. Esse batia quase o dia inteiro. A vista da frente era para a rua. Do outro lado um comércio. A banca de jornal à direita. Uma lan house abaixo da janela. Dividia a entrada e saída do prédio com pré-adolescentes a vagabundar por ali. 'Vagabundice' por direito. Nessa idade podemos- pensava.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Uma história de Vicente - 2

O mundo de Vicente era enorme. Apesar de alguns o encararem como um recluso, sua cabeça, amigos e até amores eram maiores do que se via. De qualquer forma, ele mantinha essa distancia para que continuassem a pensar assim cada parte de seu mundo. Não misturava o futebol com a arte, apesar de admirar o futebol arte. Não dormia até tarde, apesar de dormir tarde.

Tinha, cá pra mim, que agora sim ele vivia, enfim, um grande amor. E não era mentira. Mas é assunto para depois.

Começou então procurando um lugar para morar. Casa? Era o que queria, mas naquela cidade, talvez fosse difícil, tendo em vista seu salário. Sim, aceito um apartamento (como se tivesse escolha o rapaz!). Mas tem que ter revestimento de madeira na parede e dois quartos. Fora a sala e a dependência de empregada. Banheiro pode ser um só. Coitado, se achando no direito de escolher. Na verdade ele inventava o direito de escolher, afinal precisamos de caprichos na vida. Se não fosse isso, qual a graça de seguir os conformes. O lado ruim é que essas estimas que criamos nos frustram. As que temos por direito só nos fazem bem porque, caso não alcançadas, dormimos com o sentimento de que fomos injustiçados ou não nos corresponderam. Bater sol é imprescindível. Tudo bem Vicente, o sol é realmente imprescindível.